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UM GOLE DO UNIVERSO

em crônicas

Em 2016 coloquei como uma das metas do ano "Aprender a fazer um bom nhoque", mas foi só no final de 2018 que finalmente fiz um nhoque com cara e sabor de nhoque. Um prato que eu pensei "Eu pagaria por isso em um restaurante. Não pagaria muito caro, mas pagaria". E considerando meus talentos gastronômicos, pra mim isso foi uma baita conquista, que só foi possível porque eu me empenhei muito mais do que nos anos anteriores. Em um mês eu fiz mais nhoques (e tentativas de nhoques) do que a soma de todas as tentativas dos dois anos anteriores. Eu aprendi empiricamente que a repetição constante é um importante hábito para aprendermos a fazer algo que exige técnica, tal como escrever... Que é uma das minhas metas de 2019 :)

  • Foto do escritorKaren Harumi

Emma ou Laika?

Essa semana* eu estou cuidando das cachorrinhas da minha irmã na sua casa enquanto ela viaja e convidei a Niq para me fazer companhia em um dos dias.


Pela cara de pavor quando ela chegou com os latidos, eu acho que ela não esperava a festa toda que as cachorrinhas fizeram - coisa que quem frequenta a casa da minha irmã já está um pouco acostumado.


Ainda no portão a Niq começou a brincar com as cachorrinhas e percebeu que a Laika, a schnauzer que nasceu e cresceu na nossa casa, depois de 2 latidos e uma cafungada, já deu a barriguinha e lambeu até os sapatos dela, toda assanhada, como se fossem amigas há anos. Já a Emma, a vira-lata que a minha irmã adotou com 3 meses, passou a tarde inteira desconfiada. A Niq ia fazer carinho e a cachorra travava e às vezes dava umas lambidas descoordenadas, como se quisesse ser amada, mas estivesse com medo de ser machucada. Os sustos da Emma, inclusive, deixavam a Niq assustada também.


Comigo, que estou aqui sempre, as duas sempre foram muito carinhosas. Na verdade, a Emma é mais oferecida que a Laika e meio folgada quando quer carinho, mas com visitas ela sempre fica tensa e não consegue se aproximar tanto.


A Laika é muito companheira, mas bem independente. Já a Emma, quer tanto ficar do nosso lado que ela senta em cima e às vezes parece que quer fazer uma fusão de corpos. Ela claramente não tem consciência do próprio tamanho e sempre acha que cabe nuns cantos que não cabem nem o seu focinho. Além disso, a Emma é um teco ciumenta e às vezes, quando você quer que ela venha até você, é mais eficiente você chamar a Laika do que o seu próprio nome.


A Emma é amorosa, animada e pira num carinho na barriga tanto quanto a Laika, a diferença é só que você precisa passar um pouco mais de tempo com ela pra perceber isso.


E a Niq não sabia de nada disso, não entendia muito bem porque a Emma estava arisca quando ela só havia tentado fazer carinho, então eu meio que tentei explicar e não esperava a esbugalhada de olhos epifânica que veio dela:


"AH, MEU DEUS... A GENTE É IGUAL!"


A mesma surpresa com que a Niq se reconheceu na Emma eu tive ao reconhecer a Emma que há na Niq. Isso realmente explica muita coisa!


E começamos as nossas teorias:


"Você é Emma ou Laika?"


Antes eu me identificava mais com a Emma, porque ela é meio desajeitada e sem noção, mas só nisso. De resto eu sou muito mais Laika, saio abanando o rabo pra todo mundo. Achando que todo mundo é legal e deitando no chão pra oferecer a barriga pra qualquer desconhecido na esperança de receber carinho em menos de cinco segundos de contato. Não literalmente, claro. Eu não tenho rabo e evito deitar no chão.


Já a Niq até passou a se afeiçoar mais pela Emma quando a compreendeu, porque elas são muito parecidas. Muito carinhosas com pessoas próximas, mas leva muito tempo pra chegar nesse estágio e antes você precisa persistir em ficar ao lado porque as duas parecem que vão morder a qualquer hora (apesar de nenhuma delas ter feito isso, ainda).


Observar as cachorrinhas nos permitiu compreender um pouquinho mais de nós mesmas e da nossa relação.


A Niq sempre me achou exageradamente extrovertida e eu sempre a considerei excessivamente introvertida e, por uma fase da nossa amizade, não estávamos lá muito bem como pessoas e isso só acentuava esses nossos traços já extremos. E não sei pra ela, mas foi nesse dia que eu parei pra pensar melhor sobre isso.


Alguns levam mais tempo para confiar e oferecer amor, mas isso não quer dizer que não amem. Não quer dizer que não querem ser amados. Não quer dizer que amem mais ou menos do que qualquer outro. Assim como, amar só com poucos segundos de interação também não diminui o amor que você oferece e nem quer dizer que ame qualquer um. Já vi a própria Laika recusando carinho e rosnando pra gente na rua sem eu entender muito bem o porquê, provando que apesar dela dar a barriga pra 97% da população, ela possui os seus próprios critérios de apego e oferta de amor.


E por mais que pra mim isso fosse tão claro com relação as cachorrinhas, eu não usava a mesma lógica com as pessoas.


É óbvio que nós (e as cachorrinhas também) temos uma personalidade muito mais espectral do que a dualidade receosa e desinibida, e é claro também que tem muita gente mais meio-termo do que eu e a Niq, aliás, acho que a maioria, mas simplificar nossas características sociais e comparar com as cachorrinhas foi uma forma bem didática de entendê-la (e até a mim mesma) um pouco mais.


...Suspeito que a Emma é um tanto desconfiada e se assusta facilmente porque ela deve ter passado por uns maus bocados na rua quando filhotinha, antes de ser adotada - exatamente por não receber amor de alguém que ela confiou. Já a Laika é dada porque cresceu no meio de outros seis filhotinhos e, dar a barriguinha, sem nem olhar quem é que estava na sua frente, foi a maneira que encontrou de receber amor em um ambiente tão disputado e que ela levou pra vida mesmo quando eles foram para outros lares. (Escrevi de maneira crua, sem nenhuma intenção de fazer um paralelo com as nossas vidas... Mas depois de reler, já estão fervilhando mil outras coisas na minha cabeça)


Mas essas suposições são apenas teorias genéricas.


A parte empírica foi que, a empatia que a Niq despertou pela Emma quando percebeu que as duas tinham algo em comum catalizou a proximidade delas e criou um vínculo muito bonitinho de se observar. Quando a Niq respeitou o tempo da Emma, a cachorrinha pediu um pouco de carinho e no final do dia até deu a barriguinha, já a Niq não se sentia mais insegura ao lado da Emma e, muito pelo contrário, dava o dobro de amor quando a cachorrinha se assustava do nada.


Da mesma forma que, entre nós, no seu próprio tempo a Niq até contou duas ou três histórias por vontade própria (o que é muito, mesmo) e quando do nada ela se silenciava, parei de achar, constantemente, que eu havia feito alguma coisa horrível que a afastou.


E olha... Não fizemos nada além de falar sobre os dias que estivemos distantes, beber duas garrafas de cerveja, comer batatas fritas murchas e analisar as cachorrinhas... E ainda assim foi um dos nossos melhores dias que tivemos juntas! Porque no final não precisamos de nada além de nós, do jeito que somos, meio Laika, meio Emma, sentadas a tarde inteira, dispostas a sermos amigas mesmo com as nossas diferenças.



"Porque você está indo embora, titia Karen? Você não nos ama mais?"


Uma parte da barriga da Laika, da Emma e da Maggie (que hoje, coincidentemente, faz 1 ano que só está nos nossos corações - eu não planejei postar sobre as cachorrinhas bem hoje, eu muito queria ser planejada assim e talvez ter escrito algo mais a ver com a própria Maggie, mas eu realmente só fui lembrar sobre isso ao ver a foto e que bom que foi um bom jeito de lembrar!)




*Essa semana = quase dois meses atrás, quando foi originalmente escrito esse texto.

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