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UM GOLE DO UNIVERSO

em crônicas

Em 2016 coloquei como uma das metas do ano "Aprender a fazer um bom nhoque", mas foi só no final de 2018 que finalmente fiz um nhoque com cara e sabor de nhoque. Um prato que eu pensei "Eu pagaria por isso em um restaurante. Não pagaria muito caro, mas pagaria". E considerando meus talentos gastronômicos, pra mim isso foi uma baita conquista, que só foi possível porque eu me empenhei muito mais do que nos anos anteriores. Em um mês eu fiz mais nhoques (e tentativas de nhoques) do que a soma de todas as tentativas dos dois anos anteriores. Eu aprendi empiricamente que a repetição constante é um importante hábito para aprendermos a fazer algo que exige técnica, tal como escrever... Que é uma das minhas metas de 2019 :)

  • Foto do escritorKaren Harumi

É verdade esse bilhete

A empresa para a qual estou trabalhando está promovendo várias atividades sociais virtuais pra ver se a gente surta menos nesses tempos de corona.


Uma delas é o Show de Talento, da qual eu muito queria me inscrever, porque sou sim uma aparecida, como diriam lá em Lorena. No entanto, por uma confusão acabei me inscrevendo na atividade chamada Show and Tell, que seria Mostrar e Contar. Na qual os participantes mostram algo importante para eles e contam o porquê - em inglês, pra gente do mundo inteiro, via video-conferência.


Pois bem, eu não tinha como dar pra trás nessa.


Ia ser péssimo admitir que eu me voluntariei no impulso e desatenção pra minha boss.


EU NÃO TINHA NADA EM MENTE.


Até que eu me lembrei que poucos dias antes um amigo havia perguntado porque eu tinha um papel de lixo no mural da cabeceira da minha cama - e PLIM!, segue abaixo a transcrição da e a tradução em português da minha apresentação no Show and Tell da minha empresa (ou o que eu havia planejado para ter sido, mas pode ser que eu tenha comido bola com umas palavras, quase ter dado uma choradinha e esquecido várias partes):



TRANSCRIÇÃO (muito melhorada e menos gaguejada que a versão original):


Good afternoon, everyone!

I am Karen Nomura, Sourcing Manager from South America and…

Greetings from a not so hot São Paulo!


I was very doubtful about which object to choose today, because as you can see I have a lot of things and I really like them all, because they all remind me of some special person, place, PETS! or moment in my life.

But these are things that I can sell if I ever need money - not a lot of money, but a little bit.


So I decided to choose something that only has value for me.

Which is that note that my father wrote to me last year.

As you can see it is written on a calendar paper and you can hardly read the message anymore.

It looks like garbage, but I swear it isn't!


It's written in Portuguese:

"Karen, I'm going to the dentist if you want to eat the marmita at the counter you can eat, ok!"

['Marmita’ is… How can I say in English…? Lunch Box? It is a full meal inside a… Box…]


I know, even the message is not a big deal.


[dramatic pause]

...What made this note important to me is the fact that my father lived almost 20 years of my life in Japan. And since he returned, me and my family have been learning to deal with the differences between Japanese and Brazilian culture.

I cry for everything, even today Titanic shatters me.

But not only does my father not cry, but I think he doesn't even know what Titanic is.

It is very recent that he learned to hug us, and even so… It is still a kind of pushing hug.

[pushing hug imitation]

It's quite funny!

And here in Brazil, when I lived in the countryside of São Paulo, I was used to hug everyone, even the baker of the bakery. So it is really weird for all of us…

And he is not a person that says the expression "I love you" a lot and for a while I thought he was cold and distant and it hurt. I felt a little bit invisible for him.


But that day, the day I read this note, that is when I realized how wrong I was.


That was in September last year, I was working a lot and I was eating very poorly. And I ate ramen noodles for breakfast, lunch and dinner. Until I saw this message on top of a brand-new lunch box on the kitchen counter.

It wasn't a lunchbox he bought for himself and left the rest to me.

He had bought it for me, but he didn't say it directly. I don’t know why. But I knew it was for me, mainly because it was one of the dishes that I like the most and that I know he doesn't like very much.

Then I saw that my father not only WATCHED ME, but TOOK CARE OF ME silently.


With him, his love and with the intense coexistence that we are having with these quarantine days I learned that people have different ways to show their love. And that some, like me, like to talk and hug, but others, like him, say with more subtle actions.


And since that day, when he brings popcorn (which is my favorite food in the world) when we are watching a movie I know he is saying, "Hey, I love you even if I don't say it in words".


So this note is important because everyone reads:

"Karen, I'm going to the dentist if you want to eat the lunch box at the counter you can eat."


But I read:

"Karen, I love you."


TRADUÇÃO (talvez meio porca):


Boa tarde, todo mundo!

Sou Karen Nomura, Sourcing Manager da América do Sul e...

Saudações de uma São Paulo não tão quente!


Eu estava com bastante dúvida de qual objeto escolher hoje, porque como vocês podem ver eu tenho bastante coisas e gosto muito de todas elas, pois todas me lembram de alguma pessoa, lugar, ANIMAIS! ou momento especial da minha vida.

Mas tudo isso são coisas que eu posso vender se um dia eu precisar de dinheiro - não muito dinheiro, mas um pouco.


Por isso resolvi escolher algo que só tem valor para mim.

Que é essa nota que o meu pai me escreveu ano passado.

Como vocês podem ver está escrito num papel de calendário e quase nem dá mais para ler a mensagem.

Parece lixo, mas eu juro que não é!


Está escrito em português:

"Karen, estou indo no dentista se quiser comer a marmita no balcão pode comer, ok!"

[Marmita é... Como posso dizer isso em inglês...? Almoço-na-caixa? É uma refeição completa dentro de uma... Caixa...]


Eu sei, até a mensagem não é lá grande coisa.


[pausa dramática]


O que tornou esse bilhete importante pra mim é o fato que o meu pai viveu quase 20 anos da minha vida no Japão. E desde que ele voltou, eu e a minha família estamos aprendendo a lidar com as diferenças culturais entre o Japão e o Brasil.

Eu choro por tudo, até hoje Titanic me despedaça.

Mas meu pai não só não chora, como eu acho que ele nem sabe direito o que é Titanic.

É muito recente que ele aprendeu a nos abraçar, e ainda é um abraço meio empurrando.

[imitação do abraço meio empurrando]

É um tanto engraçado!

E aqui no Brasil, quando eu morava no interior de São Paulo, eu estava acostumada a abraçar até o padeiro da padaria. Então é bem estranho pra todos nós...


E ele não é uma pessoa de falar muito a expressão "Eu te amo" e por um tempo eu achei que ele era frio e distante e isso me doía muito. Eu me sentia invisível para ele,


Mas nesse dia, no dia que eu li esse bilhete, foi quando eu percebi o quanto eu estava errada.


Isso foi em setembro do ano passado, eu estava trabalhando bastante e estava comendo muito mal. Comia miojo no café da manhã, no almoço e jantar. Até que eu vi essa mensagem em cima de uma marmita novinha em cima do balcão da cozinha.

Não era uma marmita que ele comprou pra si mesmo e deixou o resto pra mim.

Ele havia comprado pra mim, mas ele não disse isso diretamente. Eu não sei porquê. Mas eu sabia que era pra mim, principalmente porque era um dos pratos que eu mais gosto e que eu sei que ele não gosta tanto.


Então eu vi que meu pai não só ME OBSERVAVA, como CUIDAVA DE MIM silenciosamente.


Com ele, o amor dele e com a convivência intensa que estamos tendo com esses dias de quarentena eu aprendi que as pessoas tem maneiras diferentes de demonstrar o seu amor. E que algumas, como eu, gostam de falar e abraçar, mas que outras, como ele, dizem com ações mais sutis.

E desde esse dia, quando ele traz pipoca (que é a minha comida favorita no mundo) quando estamos vendo filme eu sei que ele está dizendo, "Ei, eu te amo mesmo que eu não o diga em palavras".


Então esse bilhete é importante porque todo mundo lê:

"Karen, estou indo no dentista se quiser comer a marmita no balcão pode comer, ok?"


Mas eu leio:

"Karen, Eu te amo."

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